ACABOU

   Olhou-me como se precisasse dizer algo importante, mas se manteve em silencio. Não havia mais nada a ser dito após todos os insultos e berros que trocamos a poucos minutos. Respirou fundo, e ao soltar o ar, olhou-me como alguém que está fazendo as malas. Pulando para fora do barco. Diversas frases passaram pela minha mente, ainda havia tanta coisa a ser dita, esclarecer as coisas que foram mal ditas e aceitar todas que precisavam ser proclamadas. Eu poderia me desculpar, até pelo que não tenho culpa. Poderia manipular a situação fazendo-o sentir que me deve perdão. Poderia voltar a gritar, dizer que isso tudo é muito infantil, retornando a briga. Pelo menos assim, ainda teríamos algo a se agarrar. Poderia citar todos os motivos por ama-lo, apesar da dor. Poderia beija-lo e transaríamos no tapete novo da sala. Deixando assim, para lá, todas as magoas e feridas abertas.
Mas era tarde para nós. Agora sou eu que o encaro como alguém que está fazendo as malas. Observo-o coçar a cabeça, magoado e inquieto pelo silencio que nos ronda. Desvia o olhar. Nada mais precisava ser dito. Está aqui, o inevitável. E nada mais foi dito. 
Andou até a estante, pegou a chave do carro e me deu as costas caminhando para longe. E o deixo partir, sem saber o que fazer. A porta bate, fazendo o silencio parecer ainda maior. É assim que grandes historias chegam ao fim? Ou é assim que o fim estraga grandes historias? 

Nunca saberemos.

Milena Oliveira/ Tráfico de Conselhos.